Projeto de Lei Ordinária Nº 071

OBJETO: "Autoriza o Município de Gramado a proceder na requalificação do regime urbanístico do imóvel registrado sob a Matrícula nº 18.211, do Registro de Imóveis da Comarca de Gramado com a finalidade de proporcionar melhorias e transformações urbanísticas e ambientais estruturais e dá outras providências."

ORIENTAÇÃO JURÍDICA

Orientação Jurídica n.º 071/2025

Referência: Projeto de Lei n.º 106/2025

Autoria: Executivo Municipal

 

I – RELATÓRIO

Foi encaminhado à Procuradoria Jurídica, desta Casa, para emissão de Orientação Jurídica, o Projeto de Lei n.º 071/2025, de autoria do Executivo Municipal, protocolado em 15/08/2025 e leitura realizada em 18/08/2025, que busca autorização legislativa para o Poder Executivo proceder na requalificação do regime urbanístico do imóvel registrado sob a Matrícula nº 18.211, do Registro de Imóveis da Comarca de Gramado com a finalidade de proporcionar melhorias e transformações urbanísticas e ambientais estruturais e dá outras providências. No dia 22/08/2025 foi protocolada Mensagem Retificativa referente ao art. 9º, com leitura realizada no dia 25/08/2025.

O Projeto de Lei Ordinária, de iniciativa do Chefe do Poder Executivo, acompanhado de mensagem retificativa, visa autorizar uma requalificação do regime urbanístico aplicável a um imóvel específico, matriculado sob o nº 18.211 no Registro de Imóveis de Gramado. A área total do imóvel é de 46.295,00m², de propriedade da empresa Parque da Ferradura Empreendimentos Imobiliários Ltda.

O objetivo central da proposição, segundo a justificativa, é permitir a implantação de um empreendimento composto por um hotel (60 quartos) e três blocos residenciais (90 apartamentos), totalizando 19.500m² de área construída. Em contrapartida, o projeto estabelece um conjunto de medidas de mitigação e compensação urbano-ambiental, das quais se destacam:

A criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN): O empreendedor deverá instituir uma RPPN que abrangerá 15.653,98m² de área, somando-se a 22.241,02m² de Área de Preservação Permanente (APP) já existente, totalizando 37.895m² de área protegida. A criação da RPPN é um instrumento previsto na Lei Federal nº 9.985/2000 (Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC). Também, o proprietário deverá implementar uma "alameda" na Rua da Ferradura, com calçamento e iluminação pública e ainda, prevê a isenção de IPTU sobre a área da RPPN e autoriza a transferência do saldo de potencial construtivo não utilizado no imóvel para outras obras.

A justificativa do projeto informa que a medida decorre de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado com o Ministério Público (Inquérito Civil n.º 00782.001.557/2024), e que a proposta foi debatida no Conselho do Plano Diretor (CPDDI) e no Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (COMDEMA). O referido TAC é declarado como parte integrante da lei.

A Mensagem Retificativa (Ofício nº 35/2025), que alterou a redação do art. 9º, estabelecendo que as contrapartidas e obrigações do proprietário somente terão início após a aprovação dos projetos e concessão da Licença Prévia (LP) pela Secretaria do Meio Ambiente, vinculando ainda a emissão da Licença de Instalação (LI) à comprovação da integralidade das contrapartidas, excetuada a execução da alameda, que deverá estar concluída antes da concessão do habite-se.

Acompanha o presente projeto de lei, o Termo de Ajustamento de Conduta, a ata do Conselho assinada, ofício da Secretaria da Fazenda, ofício da Secretaria de Planejamento e o projeto para a área.

É o breve relato dos fatos. Passa-se a fundamentar:



II – DA ANÁLISE JURÍDICA

2.1 Da Competência e Iniciativa

O projeto, com mensagem retificativa, busca autorização legislativa para requalificação do regime urbanístico aplicável a um imóvel específico, matriculado sob o nº 18.211 no Registro de Imóveis de Gramado. A área total do imóvel é de 46.295,00m², de propriedade da empresa Parque da Ferradura Empreendimentos Imobiliários Ltda.

A Lei Orgânica estabelece que compete ao Município, no exercício de sua autonomia, a teor do inciso I e XXIV, a saber:

Art. 6º Compete ao Município no exercício de sua autonomia:

I – organizar-se administrativamente, observadas as legislações federal e estadual;

II – elaborar suas leis, expedir seus decretos e atos relativos aos assuntos de seu peculiar interesse;

(…)

XXIV – legislar sobre assuntos de interesse local;



Assim, o presente PL e a mensagem retificativa encontram-se em conformidade com as normas legais vigentes, por ser de competência do Município a normatização sobre regime urbanístico, NÃO se registrando, desta forma, qualquer vício de origem na presente propositura, nos termos do art. 61, § 1º, II, “b”, da Constituição Federal, aplicado por simetria.



2.2 Da constitucionalidade e legalidade

O projeto de lei em análise é uma lei de efeitos concretos e específicos, pois se destina a regular uma situação particular, aplicando-se a um único imóvel, identificado por sua matrícula. Leis dessa natureza são admitidas no ordenamento jurídico, mas exigem uma análise mais rigorosa sob a ótica dos princípios da impessoalidade e da isonomia.

No caso em tela, a justificativa para o tratamento individualizado reside no interesse público subjacente: viabilizar uma ampla área de conservação ambiental (RPPN) e melhorias urbanísticas em troca da flexibilização de certos parâmetros construtivos. A negociação, intermediada pelo Ministério Público através de um TAC e aprovada por conselhos municipais, confere uma camada de legitimidade e mitiga o risco de ofensa à impessoalidade, pois demonstra que a solução foi construída para atender a um interesse coletivo (ambiental e urbanístico), e não apenas ao interesse privado do empreendedor.

O projeto dialoga diretamente com o Plano Diretor de Gramado -Lei Complementar nº 17/2022-, inclusive isentando o empreendimento da aplicação de um de seus artigos, em atendimento ao artigo 127. Embora alterações pontuais na legislação urbanística por meio de leis específicas sejam possíveis, é fundamental que não descaracterizem as diretrizes macro do Plano Diretor.

Acerca do regime urbanístico das várias zonas em que se encontra dividido o território do Município, o Plano Diretor do Município, instituído pela Lei Complementar nº 17, de 2022, dispõe:

Art. 9º São objetivos gerais do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI):

I - a organização física territorial da área urbana e rural quanto ao uso e ocupação do solo, com vista à perfeita adequação entre as funções urbanas e rurais;

(…)

Art. 53. Macrozoneamento é o estabelecimento de áreas diferenciadas de paisagens urbanas ou rurais e de adensamento, uso e ocupação do solo para dar a cada região do município melhor utilização em função de suas características ambientais e locacionais, das diretrizes de mobilidade, do desenvolvimento harmônico da comunidade e do bem-estar de seus habitantes.

 

A justificativa do projeto alega que a proposta é vantajosa para o município, pois a área de proteção ambiental criada será significativamente maior do que a exigência legal padrão, o que funcionaria como uma compensação pela flexibilização. A criação da RPPN, por sua vez, está amparada na Lei Federal nº 9.985/2000 (SNUC).

A vinculação da lei a um TAC firmado com o Ministério Público, no artigo 13, é um elemento de grande relevância jurídica. O TAC é um instrumento legal que busca a reparação ou compensação de danos a interesses coletivos. Ao transformar os compromissos do TAC em lei, o Município confere maior força normativa e segurança jurídica ao acordo, garantindo que as contrapartidas ambientais e urbanísticas serão cumpridas como condição para a realização do empreendimento.

O artigo 6º, que autoriza a transferência do potencial construtivo não utilizado, é um instrumento previsto no Estatuto da Cidade -Lei Federal nº 10.257/2001. Sua aplicação no caso concreto, como forma de compensar o proprietário pela preservação ambiental de parte significativa do imóvel, é juridicamente válida, desde que regulamentada e aplicada conforme a legislação urbanística municipal.

A isenção de IPTU para a área da RPPN, prevista no artigo 11, é um incentivo fiscal para a conservação ambiental, também previsto no SNUC e em diversas legislações. Neste ponto, conceder incentivos sob a forma de desconto em imposto para propriedades que contenham áreas de preservação permanente ou proteção ambiental pode acabar por significar que o Município está fazendo renúncia de receita, medida cuja legalidade se sujeita à observância da Lei Complementar nº 101, de 2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF).

Neste aspecto, a Secretaria da Fazenda manifestou pelo Ofício nº 182/2025:

Considerando o Parecer Consultivo em anexo ao processo digital n° 26134/2025 , que entendeu pela possibilidade de instituição de isenção de IPTU sobre 37.895m² dentro do todo de 46.295,00m² da Matrícula nº 18.211 do RI/Gramado, em atenção ao PL que instituíra essa porção de área em RPPN, não há necessidade de apresentação de impacto orçamentário, uma vez que a previsão de renúncia de receita referente ao IPTU estarão previstos na LDO a partir de 2026, de acordo com a Lei a ser proposta.

 

Portanto, a ressalva de que a matéria será regulamentada por lei específica é prudente e atende às normas do Código Tributário Nacional, que exigem lei específica para a concessão de isenções.

A Mensagem Retificativa ao art. 9º, ao condicionar a execução das contrapartidas às etapas do licenciamento ambiental, encontra amparo no ordenamento jurídico, reforçando a segurança jurídica do empreendimento e evitando riscos de início prematuro de obras sem prévia análise técnica ambiental. A medida está em consonância com a Lei Federal nº 6.938/81 (Política Nacional do Meio Ambiente), que prevê o licenciamento como requisito obrigatório para empreendimentos potencialmente impactantes. Trata-se de ajuste que preserva o interesse público e fortalece a regularidade ambiental e urbanística do projeto

Por fim, diante da matéria tratada, ainda que acompanhada de TAC e manifestações dos Conselhos, recomenda-se a instrução do projeto com realização de audiência pública, em observância do disposto nos incisos II e XIII do art. 2º, no § 4º do art. 40 e no inciso II do art. 43 da Lei Federal nº 10.257, de 2001 (Estatuto da Cidade), que estabelecem:

Art. 2º […]

(…)

II – gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamento de planos, programas e projetos de desenvolvimento urbano;

(…)

XIII – audiência do Poder Público municipal e da população interessada nos processos de implantação de empreendimentos ou atividades com efeitos potencialmente negativos sobre o meio ambiente natural ou construído, o conforto ou a segurança da população;

Art. 40. […]

(…)

§ 4o No processo de elaboração do plano diretor e na fiscalização de sua implementação, os Poderes Legislativo e Executivo municipais garantirão:

I – a promoção de audiências públicas e debates com a participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade;

Art. 43. Para garantir a gestão democrática da cidade, deverão ser utilizados, entre outros, os seguintes instrumentos:

(…)

II – debates, audiências e consultas públicas;

 

 

III – CONCLUSÃO

Por todo o exposto, no aspecto jurídico, em observância aos princípios constitucionais vigentes, conclui-se que o PLO 071/2025 e a mensagem retificativa atendem as normas legais impostas, estando presentes a legalidade e a constitucionalidade.

Desta forma, esta Procuradoria exara Parecer jurídico favorável à sua tramitação.

Por fim, encaminha-se a Comissão de Legislação e Redação Final, e, à Comissão de Infraestrutura, Turismo, Desenvolvimento e Bem-estar Social para posterior deliberação, e aos nobres edis para análise de mérito, em Plenário, no que couber.

É o parecer que submeto à consideração.

Gramado, 26 de agosto de 2025.

 



Endi de Farias Betin

 Procuradora Geral

OAB/RS 102.885

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